sexta-feira, 4 de abril de 2008

“The Raft of George W. Bush” - Joel Peter Witkin





A exposição do Joel Peter witkin no Pac - Padiglione d'Arte Contemporânea em Milão, com obras que abrangem cronologicamente praticamente toda a sua carreira é totalmente imperdível.

O último trabalho do artista em exposição, é o perturbador “The Raft of George W. Bush” feito em 2006 e exposto pela primeira vez na Galeria Baudoin-Lebon.

Para uma leitura mais superficial, perturbador talvez nem seja, aparentemente, a palavra mais adequada, já que ao contrário da quase totalidade de todas as suas outras obras, o fotógrafo, não recorre nem a cadáveres como modelos, nem a modelos deformados, hermafroditas ou amputados, nem a órgãos humanos ou de animais em decomposição, elementos recorrentes na orquestração das suas sublimes composições, mas apenas a modelos “ditos normais” ou perto daquilo que julgamos “normal”, para encenar de forma quase mimética, o famoso quadro “Raft of the Medusa” de Theodore Gericault.




Talvez por isso, esta obra, que aparentemente não choca o espectador como muitas outras obras suas, possa ser uma das mais chocantes e perturbadoras, inaugurando uma nova fase no seu trabalho. Mas é necessário irmos mais fundo, para percebermos, o que de facto de novo há em “The Raft of George W. Bush” e porque é que esta obra, se analisada em profundidade, acaba na sua aparente normalidade, por ter muito mais segredos a desvendar.

Nos seus anteriores trabalhos, Joel Peter witkin recorre a obras artísticas, consideradas pelo imaginário colectivo, enquanto exemplos finais da arte e da beleza, desconstruindo estes conceitos, mostrando-nos que uma Vénus de Milo verdadeiramente amputada (são fotografias de modelos reais e não manipulações digitais), ou uma Vénus de Botticelli hermafrodita, têm em si a mesma essência que as obras originais, porque ambos são representações do belo, capazes de despertarem em nós, reflexões acerca da nossa transcendência.

Witkin, que é profundamente religioso, afirma que todos os modelos que tem fotografado nos seus anteriores trabalhos, não são aberrações nem desvios da natureza, porque foram criaturas criadas por Deus e Deus não erra! Por isto, todas as criaturas são belas.

Através desta desconstrução e reconstrução, os trabalhos de Witkin, são uma reflexão acerca da vida e também da morte (para Witkin, a morte faz parte da vida), acerca do Homem, da Humanidade e da nossa existência humana, sejamos religiosos ou não.

Alguns exemplos de trabalhos de Witkin, seguidos da obra referenciada.










Voltando ao seu último trabalho, para Witkin a “The Raft of George W. Bush”, representa a deriva da Nação Americana e da Humanidade, devido à sede de petróleo e à ganância do actual sistema capitalista.



Visto assim, até pode parecer simplista e até podemos ser levados a pensar que esta “The Raft of George W. Bush”, é apenas um manifesto político contra Bush, a sua administração, a guerra do Iraque e tudo isso mais. Claro que o é! É um manifesto político sem dúvida, mas que não se esgota na simples representação paródica, de um Bush patético e de toda a sua administração criminosa em cima de uma jangada à deriva num oceano revolto.

Obviamente que a parte paródica está lá e é igualmente genial, Witkin, afirmou publicamente, que o actor que representa Bush na jangada foi conseguido através de um casting de sósias, mas o que mais genial esta “The Raft of George W. Bush” tem, é o facto, de Witkin, que toda a vida fotografou cadáveres, mutilados, anões, recorra agora a modelos com aparência “normal”, para representar aquilo a que ele chama um navio de loucos, seres estes sim, ao contrário dos seus habituais modelos, criaturas verdadeiramente desviantes e aberrantes, que podem estar a levar a humanidade à destruição.

Igualmente genial foi a obra escolhida por Witkin como porto de partida. A Pintura “Raft of the Medusa”, foi igualmente na sua época, um manifesto politico de Theodore Gericault, ao total silêncio da imprensa perante o naufrágio da Fragata Medusa e ao manto de silêncio de chumbo das autoridades.No desatre da fragata Medusa, morreram mais de 100 pessoas, que foram simplesmente abandonadas à sua sorte.

Para pintar com o maior realismo possível as figuras, Gericault fez a maior parte dos esboços numa morgue. A partir daqui, todas as interpretações são possíveis e é isto que pode tornar uma obra de arte fascinante.

Para quem não conhece o trabalho de Witkin, mais uma vez de frisar, que nenhuma das suas imagens é tratada digitalmente. Todos os seus trabalhos, são ampliações em papel, de fotografias analógicas, feitas a composições “reais”.

Mais informações sobre o artista aqui, aqui, aqui e aqui, mas muitas outras há por aí.

Saudek, ... bem depois de saborear um Pierre Marcolini , quem é que é capaz de meter na boca um chocolate qualquer ordinário a saber a sabão?

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