quarta-feira, 12 de maio de 2010

Istanbul #2



“ … Esta massa de água que passa no coração da cidade não pode em caso algum ser comparada com os canais de Amesterdão ou de Veneza, nem com os rios que sulcam paris ou Roma: aqui há correntes, ventos, ondas, profundeza, trevas. Quando somos levados pela corrente, ou quando começamos a ser arrastados de lado, como um caranguejo, direitos aos vapur das linhas urbanas, então Istambul desfila à nossa frente: Primeiro as mulheres de certa idade que nos olham tomando o chá na varanda, os prédios, os yali, o café com a sua ramada ao lado do cais de embarque, as crianças que tomam banho em cuecas no sítio onde desembocam os esgotos e depois se secam deitadas no asfalto, os pescadores na margem, os que vegetam dentro do seu cúter, os alunos que saem da escola de pasta na mão e que andam à beirinha da margem, os passageiros que olham para o mar através das janelas do autocarro parado no trânsito, os gatos que espreitam os pescadores no cais, os plátanos (descobrimos então como são altos), os konak rodeados pelos respectivos jardins que só conseguimos ver do mar e não da marginal, donde não se vê nada, as ladeiras, as colinas por trás das ladeiras, e os prédios altos na linha do horizonte – Istambul desfila, com todo o peso do seu caos, … “

Pamuk, Orhan (2008). Istambul - Memórias de uma Cidade. Lisboa: Editorial Presença.

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