terça-feira, 4 de março de 2008
Witkin e Saudek em Milão
No momento quem estiver ou for proximamente a Milão, terá dificuldade em escolher que exposição ver primeiro. Além da grande retrospectiva do Avedon e que já falei aqui, inaugurou esta semana a exposição SAUDEK e WITKIN, no Pac.
A exposição que esteve inicialmente pensada para o Palazzo Reale, mas que acabou por ser exposta no Pac - Padiglione d'Arte Contemporânea, por intervenção directa da conservadora (destesto-a) Letizia Moratti, Sindaco da Comune di Milano, e que é em Itália, o orgão mais ou menos equivalente à nossa Câmara Municipal, reúne cerca de 100 obras de Witkin e Saudek.
Letizia Moratti, não quis na principal sala de exposições da cidade, quem sabe se por estar mesmo ao lado do Duomo, Witkin e Saudek, considerando as imagens chocantes demais. Vai daí, remeteu os dois fotógrafos, para uma galeria (acho que excelente, mas à qual nunca fui) também pertencente à Comune di Milano.
Talvez para não levantar muitas ondas, e calar as vozes que se tinham levantado a acusa-la de homofóbica, quando não deixou que a exposição acerca da homossexualidade na arte se realizasse, trouxe para o Palazzo Reale Francis Bacon e como se não bastasse sete esculturas de António Canova.
Ganha a cidade, que assim pode ver um dos grandes pintores do Sec XX, o maior escultor do neoclassicismo e um grande fotógrafos, o Joel Peter Witkin!
Começando por SAUDEK e WITKIN, para quem conhece ambos os artistas, a mistura parece bombástica. Se aparentemente para um olhar leigo, se podem encontrar semelhanças entre os dois, na verdade não poderia haver maiores diferenças.
O trabalho de Witkin é de uma religiosidade profunda e está enraizado nas mais profundas reflexões acerca da vida, da morte e da humanidade. O trabalho de Saudek, é hedonista, pleno de cinismo (o próprio diz desprezar todos os valores morais) e de certa forma superficial. Enquanto em qualquer trabalho de Witkin, encontramos referências profundas e reflexivas à história da arte, Saudek utiliza essas referências, como poderei dizer, de forma meramente formal ou decorativa.
Os trabalhos do Witkin são um todo constante que se foi desenvolvendo e consubstanciando de forma coerente ao longo do tempo, numa estética extremamente aprofundada e desenvolvida, e os trabalhos de Saudek, oscilam entre boas abordagens Kitsch e a maior pura pirosada, sem disso ter qualquer consciência.
Joel-Peter Witkin, é para mim um dos maiores fotógrafos vivos e um dos maiores fotógrafos de sempre. Das suas duas grandes exposições que já vi, nunca mais consegui esquecer as suas imagens.
A primeira foi na Galeria da Casa das Caldeiras em Coimbra e ainda hoje me emociono, quando recordo as suas fotografias, expostas no meio da antiga maquinaria que aquecia a água do antigo Hospital da Universidade de Coimbra. Foi uma das melhores exposições que vi em toda a minha vida. Organizada pelos extintos Encontros de Fotografia de Coimbra, com a direcção do Albano da Silva Pereira, teve a colaboração do Manuel Reis. na excelente montagem e luz.
A segunda foi igualmente organizada pelos Encontro de Fotografia, mas desta vez na Galeria do palácio da Inquisição e foi igualmente soberba.
Witkin fotografa quase em exclusivo homens, mulheres, crianças, animais, deformados, amputados, hermafroditas, transexuais e cadáveres inserindo-os com extrema delicadeza e respeito religioso, o termo correcto seria sagrado, em cenários que nos conseguem contar, por vezes numa só imagem, toda a história da arte.
Contemplar uma fotografia de Witkin é contemplar uma obra de arte, quando se acredita que uma expressão artística, seja ela qual for, é muito mais que o consumo de um artefacto bonitinho e agradável aos sentidos, pronto a ser consumido e esquecido no minuto seguinte.
De Saudek pouco mais conheço que o seu primeiro livro, que comprei em Praga quando o fotógrafo começava a ser descoberto na Europa. No momento gostei, quanto a mim os seus primeiros trabalhos são os melhores, mas rapidamente descobri outros fotógrafos dentro de idêntico paradigma estético, entre os quais Pierre Gilles que me passaram a interessar muito mais.
Francis Bacon e Canova no Palazzo Reale e Witkin (e Saudek) quase ali ao lado é mais que suficiente para uma ida a Milão.
Com as promoções fantásticas da Easyjet, pode começar por Bacon, o pintor que quase se pode dizer que pintou algumas das coisas que witkin fotografou, seguir para Canova (as suas obras são referência recorrente nos trabalhos de Witkin) e finalmente acabar com Witkin para fazer a síntese de tudo. No final do dia, não deixe de ir tomar um expresso à cafetaria do último andar da La Rinascente, depois de ter comprado umas cuequitas da Dolce & Gabbana, para não ficar com alma limpa e negra demais.
Quem quiser ver mais acerca de witkin, aqui tem um excelente portfólio.
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