quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Nunca mais nada será igual.


Pois é, é já na sexta-feira.

No momento em que escrevo, ainda não sabemos se Sócrates vai dar ou não liberdade de voto aos deputados do seu partido, para votarem uma proposta de lei que é mais justa que a do PS, não sabemos se o BE vai votar favoravelmente a lei do PS (se o BE votar contra corre-se seriamente o risco da lei ser chumbada) e as pessoas gays e lésbicas deste país, continuam a ser para os políticos apenas reféns do jogo político/partidário e não pessoas reais com problemas concretos de discriminação, que os afectam todos os dias da sua vida.

Mas na próxima sexta-feira, se a proposta de lei do PS passar, se a proposta de lei do Bloco e dos Verdes tiver uma boa votação, não só dos seus respectivos deputados mas também de alguns deputados do PS e quem sabe até de algumas cabeças menos desempoeirada e hipócritas do PSD, que também por lá as deverá haver (leio no momento no DN que o PSD vai dar liberdade de voto total aos seus deputados), o que é que vai estar diferente no sábado de manhã?

Absolutamente nada e absolutamente tudo, porque nunca mais nada será igual.

Absolutamente nada, porque a proposta de lei que vier a ser aprovada ainda vai ter muito que andar até ir a votação final em plenário, e absolutamente nada, porque os homofóbicos vão continuar a ser homofóbicos, os obscurantistas obscurantistas, os reaccionários reaccionários, os discriminatórios vão continuar a discriminar e até os mentecaptos continuarão a ser mentecaptos, porque uma lei só por si, não muda comportamentos, uma lei só por si não gera mudança alguma.

Mas depois de sexta-feira, se a lei do PS passar, nunca mais nada será igual, porque foi dada uma mensagem clara e inequívoca aos homofóbicos, aos reaccionários disfarçados em pele de cordeiro e a todos os mentecaptos deste país, que cada vez que tiverem um comportamento, um pensamento, uma atitudes negativa contra uma pessoa LGBT, estão a posicionar-se do lado errado da História, estão a ter um comportamento que a lei não suporta, um comportamento que a lei não encoraja.

Provavelmente após o dia 08 de Janeiro muitos mais homofóbicos sairão do armário, têm sido aliás aos milhares os homofóbicos que nestes últimos meses têm feito o seu coming out, e muito tempo depois de sábado, quando a lei tiver sido aprovada, talvez até apareçam funcionários do Registo Civil que se recusem a casar pessoas do mesmo sexo invocando objecção de consciência, quando ao fim e ao cabo, afinal o que fazem é simplesmente não exercer a sua função, talvez mais pessoas no trabalho venham a ser discriminadas quando disserem que se vão casar, talvez venham até a aumentar, eu diria apenas mais visíveis, as agressões homofóbicas, mas tudo isto será um milhão de vezes preferível ao manto de chumbo de silêncio, que as pessoas gays e lésbicas têm sido alvo durante décadas de democracia neste país, porque tudo isto é preferível ao não reconhecimento à existência e ao não reconhecimento da igualdade perante a lei.

Só se pode combater aquilo que existe, aquilo que tem forma, aquilo que é visível. Ninguém consegue caçar fantasmas porque os fantasmas só existem dentro de nós e, depois do dia 08 de Janeiro, há a possibilidade de existência de uma lei, que de forma clara vai afirmar que as pessoas gays e lésbicas, são tão dignas de casarem quanto as heterossexuais, porque são pessoas tão dignas como outra qualquer.

Parece que houve uma petição para um referendo assinada por mais de 90.000 pessoas, parece que até foi feita uma sondagem em que mais de 75% dos inquiridos mostraram ser a favor do referendo. Óptimo, isto só vem reforçar a ideia que não só a AR precisa urgentemente de aprovar esta lei, como muitas outras que combatam a homofobia que medra neste país como mato. Afinal ainda tudo está por fazer e as mais de 90.000 assinaturas, se provam alguma coisa, apenas provam que ainda há um longo caminho a percorrer.

Que os PS e o BE não desperdicem esta oportunidade, porque já nada é igual.

Para terminar, a imagem lá de cima é do Keith Harring (1958 – 1990), artista gay militante assumido, que morreu de SIDA em 1990 e que dedicou os últimos anos da sua vida a acções de combate à SIDA.
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Nota após publicação: Sócrates já deu o primeiro passo para foder tudo, que Louçã seja mais consciente que ele e mostre verdadeiramente maior respeito pelos gays e lésbicas portugueses.

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