terça-feira, 1 de novembro de 2011

Coralie Bickford-Smith for Penguin Books_EXD’11_Tangencial







“ A palavra escrita ensinou-me a pensar”, cito de memória, escreveu um dia uma das minhas escritoras de sempre, Marguerite Yourcenar.

Tenho com os livros uma relação física, possessiva. Preciso de os manusear, de os datar assim que os compro, de os assinar, para que neles para todo o sempre fique assinalado que são meus. Quando os leio, não tenho pejo qualquer em sublinhar frases a caneta, ou até marcadores fluorescentes, escrevinhar anotações nas margens. Não me rala nada que fiquem manuseados, com marcas de suor das minhas mãos na capa, dobragens nas folhas. Tento usar marcadores, mas como uso um para cada novo livro, desde cartões de embarque a tiras de jornal, vai tudo e, se nada houver à mão, vai dobra na página. Gosto deles assim e sou muito egoísta, odeio emprestar livros. Empresto alguns e já perdi alguns. Lembro-me dos que não me foram devolvidos como filhos que se perdem.

Se me pedissem para fazer uma lista, dez que fossem, dos livros que levaria para a ilha deserta, entraria em dissonância cognitiva e não conseguiria decidir-me mas, se o pesadelo Fahrenheit 451 se tornasse realidade, não hesitaria em tornar-me um LIVRO.

Por tudo isto, nunca pensei sequer que um eBook pudesse curar-me da dependência física que tenho com os calhamaços de papel. Gosto de os ter em casa, de lhes sentir os cheiro, de os ver na estante, mesmo que a porra dos ácaros por vezes me obriguem a tomar Zyrtec e isto me valer uma grande moca.

Tenho um sonho, passar pelos meus livros de sempre, o olhar pelas palavras, tal como o escritor as escreveu, e, isto não é bem a mesma coisa que ler o livro no original. Tenho um O Processo em tuguês que li e um que comprei um dia em Praga em checo, mesmo não entendendo patavina de checo, porque idiota, naquela altura, não sabia que Kafka o tinha escrito em Alemão. Tenho um Memórias de Adriano ao lado do Mémoires d'Hadrien e sonho um dia ter um "Prestuplênie i Nakazánie" ao lado do meu Crime e Castigo, mesmo não entendendo patavina de russo e não me passando sequer pela cachimónia vir um dia a aprendê-lo. Mas ainda espero conseguir um dia ler Comedìa antes de morrer.

Bom, com este paleio, todo já deu para perceberem que sou altamente suspeito ao recomendar-vos a exposição Coralie Bickford-Smith — para a Penguin Books. São livros, apenas livros, ou melhor livros fechados, fora do alcance das mãos, uma pilha deles exposta numa parede com a ajuda de uma Conceal Book Shelf (um objecto que um dia ainda haverá de aparecer por aqui como "objecto perfeito"), outros alinhados dentro de vitrinas suspensas na parede.

Porque é que é imperdível? Vou roubar as palavras ao Royal: “Numa era tecnológica, em que os livros virtuais conquistam cada vez mais leitores, que sentido faz continuar-se a desenhar e a produzir livros em papel?”; “Poderá o design transformar o livro num objecto, com uma memória e uma vida, perto da realidade dos nossos objectos?”; “O que motiva Coralie, uma designer com a sua idade, a perseguir linguagens de outras épocas e a transformá-las em capas de livros? Podem os clássicos continuar a ter abordagens novas e contemporâneas na nossa sociedade virtual? Quão úteis podem ser?”

A exposição é gratuita, é visitável de 30 Setembro a 25 Novembro (e desta vez ninguém pode queixar-se que só recomendo coisas que já acabaram), de Seg. a Sex., entre as 09:30–13:30 e as 15:00–19:00 e está no Espaço BÁ, que fica na Rua do Barão, Nº 10 (mesmo ao lado da Sé) em Lisboa.

Encerra Sábado e Domingo, porque é uma Tangencial da EXD’11, o que trocado por miúdos quer dizer, que é uma exposição que viu a luz do dia exclusivamente graças à iniciativa e empreendedorismo, das pessoas que acharam que tinham que mostrar um trabalho maravilhoso. Esta do empreendedorismo é para quem não gosta de perder a buzzword do momento.

Tangencial da EXD’11, também é sinónimo de não ter recebido um cêntimo do orçamento reduzido da EXD’11 (dois milhões e cem mil euros) e que o apoio da EXD’11, consistiu apenas em “constar no programa da EXD’11”.

Imperdível.

E, obrigado Luís.











Nota final e que com esta Tangencial nada tem a ver: Os azedumes que conseguirem extrair da análise de conteúdo ao que já escrevi, ou aqui ou no facelifting, acerca da Experimenta deste ano, apenas se devem aos erros básicos costumeiros, que a Experimenta insiste e em cometer de forma cíclica e reincidente de dois em dois anos. Quais são? Bom a seu tempo, mesmo que as exposições já todas tenham fechado, acerca deles por aqui escrevinharei.

Para já, e como provavelmente quando acerca das outras exposições falar já todas devem ter terminado e porque o PGFV ainda não conseguiu ver tudo, para já, também imperdíveis são:

- Fernado Brízio - Desenho Habidado;

- Utilitas Interrupta;

- Useless?? - Uma perspectiva Explodida;

- Useless?? - A Dor Errante;

- Action For Age - Intergeracionalidade;

- Edition of Six — Where design meets craftsmanship.

Sem comentários: